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O Dia Internacional das Meninas à luz da teoria feminista de Política Internacional


O campo das Relações Internacionais (RI) - enquanto ciência - teve seu desenvolvimento marcado pelos estudos sobre guerra, paz e cooperação internacional, considerando frequentemente o Estado como principal ator no ambiente global.

Todavia, quando consideramos a complexidade dos fenômenos que atingem a sociedade civil na atualidade, é possível identificar novos atores - a exemplo de Corporações, Organizações Internacionais, ONGs, mídia internacional, grupos organizados - articulados em diferentes níveis em novas agendas sobre Segurança Internacional, Economia e Direitos Humanos.

É neste contexto que se intensifica o debate acerca dos direitos humanos e do papel de grupos sociais ao redor do globo, em que as definições de “política”, “internacional” e “desenvolvimento” passam a ser insuficientes, se analisadas apenas no olhar das teorias tradicionais das RI.

Diferente do que defendem as teorias clássicas das Relações Internacionais, destaca-se aqui a importância de discutir novas agendas e problemáticas que emergem em evidência no século XXI: como o processo de discussão e promoção dos Direitos Humanos das meninas e mulheres adolescentes no cenário global.

O que justifica a escolha deste grupo social como tema de debate e mobilização internacional? segundo dados da Organização das Nações Unidas, meninas e jovens adolescentes constituem um grupo vulnerável e desproporcionalmente inserido em contextos de desigualdades, pobreza e violência, em temáticas controversas abrangendo violência sexual, gravidez precoce, casamento infantil, exploração de trabalho, evasão escolar, miséria e, a depender da região, na condição de refugiadas, visto que as meninas e mulheres constituem o maior contingente de refugiados no mundo.

Dados estatísticos de pesquisas da ONU e a agência Plan (?) apontam que 150 milhões de meninas já foram vítimas de violência sexual (o dobro do número de meninos) no meio escolar, há uma diferença de acesso à educação, pois 75 milhões de meninas não frequentam a escola.

Apesar dos cenários pessimistas, a OIT (Organização Internacional do Trabalho) sugere que o investimento em políticas públicas voltadas a ampliação dos direitos das meninas e jovens no acesso à educação afeta positivamente a economia, visto que “a cada ano que uma aluna permanece na escola, seu potencial de renda cresce de 15% a 20%”, além de ao mesmo tempo afastar a ocorrência de diversas problemáticas como gravidez precoce, casamento e trabalho infantil, entre outros.

Por isso, faz-se necessário redesenhar o campo da Política Internacional considerando os efeitos que as políticas de cada país e os eventos internacionais produzem na vida das meninas e mulheres.

Neste caso, adotaremos a abordagem feminista e de gênero promovida pela autora Cyntia Enloe no estudo da Política Internacional, com relação às condições de vida das meninas e jovens ao redor do globo.

O mês de outubro traz uma data simbólica relevante sobre o tema, no dia 11 ocorre a celebração do Dia Internacional das Meninas, instituído pela ONU com o objetivo de reconhecer os progressos que já foram atingidos pelos governos e ampliar estratégias para a eliminação da desigualdade de gênero em todo o mundo.

O trabalho pioneiro de Cyntia Enloe evoca a importância da teoria feminista nas Relações Internacionais, partindo de uma simples pergunta no campo de estudos: “Onde estão as mulheres?”. Da mesma forma, perguntar a respeito de “Onde estão as meninas e jovens no cenário internacional?” é o questionamento inicial, que nos possibilita entender como - de fato - os significados dos eventos internacionais contribuem para a perpetuação de desigualdades capazes de determinar - muitas vezes - o lugar que estas meninas e mulheres irão ocupar nos espaços de poder e dentro das fronteiras de cada país.

Na visão da autora, mulheres e meninas são atores internacionais relevantes, mesmo quando não ocupam as esferas de poder ou lugares privilegiados nas regiões em que habitam.

Para ilustrar o argumento de Enloe, consideremos os dados recentes da OCDE (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico) que indicam que a desigualdade de gênero custa 12 trilhões à economia mundial, ao afetar os mercados de consumo e de trabalho, enquanto que de forma específica o Relatório do Fundo de População Mundial das Nações Unidas ressalta que “se todas as meninas de 10 anos de idade que vivem em países em desenvolvimento completassem o ensino médio, a economia desses países poderia gerar uma renda anual adicional de 21 bilhões de dólares”, isto é, tais meninas e mulheres representam um grupo social com potencial não só de modificar as relações econômicas globais, mas de consolidar uma sociedade com viés de crescimento econômico que contemple a justiça social.

Desta maneira, é fato que meninas e jovens representam atores internacionais facilmente marginalizados nas discussões globais e nas abordagens acadêmicas. São muitos os contextos controversos que podem nos servir de exemplo para compreender a amplitude das questões acerca das meninas e jovens, desde a Economia política da prostituição e turismo sexual infantil no cenário internacional, que movimenta milhões e impacta negativamente a vida de mais de 1,8 milhões de crianças e jovens no globo.

Segundo a ONU: “A encruzilhada dos 10 anos de idade simboliza um momento crucial na vida não só das meninas, mas do país”. Conforme o pensamento de Cyntia Enloe, a defesa da igualdade de gênero muitas vezes se alinha à necessidade de desafiar os privilégios masculinizados nas práticas do cenário internacional, porque o que consideramos simplesmente “cultural” ou “natural” na fronteira dos países, na verdade reflete elementos fortemente políticos que não podem se dissociar das condições e desafios enfrentados diariamente pelas meninas no cenário internacional.

Por esta razão, o Dia Internacional das Meninas se torna uma data não apenas para celebrar o progresso dos avanços internacionais, mas para denunciar as desigualdades ao redor do globo; trata-se de uma oportunidade simbólica para que coloquemos no centro da discussão global a situação de meninas e adolescentes, sujeitas a discriminação e violência no país em que vivem, de forma a questionar os discursos, políticas públicas e medidas de cooperação internacional que ignorem os efeitos nocivos da desigualdade de gênero.


Referências


ONU BR. Meninas de 10 anos essenciais para alcance das metas de desenvolvimento , diz relatório UNFPA. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/relatorio-do-fundo-de-populacao-da-onu-destaca-importancia-das-meninas-de-10-anos-para-o-alcance-metas-globais-desenvolvimento/> Acesso em: 09 de Outubro de 2017


UNFPA. 10, como nosso futuro depende de meninas nessa idade decisiva. Dispovível em: <http://www.unfpa.org.br/Arquivos/swop2016.pdf> Acesso em: 09 de Outubro de 2017


ENLOE, Cyntia. Bananas, beaches and bases: Making Feminist Sense of International Politics. University of California Press, 1989.

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