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Mediterrâneo: Cemitério de imigrantes


Segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), 16.681 migrantes morreram ou desapareceram na travessia do Mediterrâneo entre 2014 e 2018, entre os países europeus que mais receberam refugiados estão Espanha (17.781), Itália (16.520) e Grécia (13.435). O Observatório Sírio para os Direitos Humanos (OSDH) divulgou em março deste ano que cerca de 511 mil pessoas já morreram na guerra da Síria desde 2011, a maioria vítima do próprio governo de Bashar Al-Assad.


Em vez de seguirmos as discussões sobre a “crise dos refugiados”, há uma evidente necessidade de falar sobre a maior crise dos direitos humanos em âmbito global desde o término da Segunda Guerra Mundial, quando mecanismos de proteção legal (leis, tratados, convenções, constituições e organizações governamentais e não governamentais) emergiram trazendo às relações internacionais maior responsabilidade e reconhecimento sobre o valor do ser humano.


Os direitos humanos para que sejam defendidos e promovidos necessitam que os governos sejam democráticos, que defendam a igualdade, justiça e liberdade de todos. No entanto, como aponta o Relatório Anual da Anistia Internacional (2017/2018) enfrenta-se mundialmente um retrocesso democrático que é promovido pelos recentes governos eleitos de extrema direita, como nos Estados Unidos por Donald Trump e na Itália por Matteo Salvini.


Segundo o teórico crítico de Relações Internacionais, Andrew Linklater (1998), é necessário refletir sobre novas formas de comunidade política que cortam as ligações entre soberania, territorialidade, cidadania e nacionalismo, trazendo questões centrais das relações internacionais que dizem respeito aos fundamentos éticos da comunidade política na era pós-westfaliana. Isto, porque desde a formação do sistema de Estados, iniciado no Tratado de Westfalia (1648), a concentração de poder nas mãos de um grupo/governo (minoria) gera automaticamente a exclusão de vontades dos que são liderados.


Em um cenário onde os direitos humanos voltam a ser ameaçados pela memória curta da humanidade que esqueceu a história recente do mundo (de 70 anos atrás), é preciso repensar os conceitos defendidos pela teoria neorrealista de Relações Internacionais, que prega a soberania nacional como meio de proteção da territorialidade – discurso sustentado pelos governos de direita, e que se fortalecem na União Europeia, como motivo para impor fronteiras e limites para que imigrantes não entrem mais no continente.


Para Linklater (1998), repensar a questão de direitos limitados a quem é detentor de uma nacionalidade, cidadão do país, exclui a importância do universalismo moral que compreende que guardar a dignidade do ser humano está acima de um documento que mostre o vínculo da pessoa humana com um governo ou país.


Por que a discussão sobre universalismo ético é tão importante nos nossos dias? Porque é preciso conhecer que toda história têm dois ou mais lados. A Síria está em guerra desde 2011 e milhares de civis tiveram suas vidas interrompidas pelos conflitos de interesses entre o governo de Assad, rebeldes e outros países que se envolveram direta e indiretamente no conflito. De outro lado, a Europa entrou em crise política e econômica em 2008 – gerando, por esses e outros motivos, a saída do Reino Unido da União Europeia – tendo centenas de europeus desempregados, com a habitual qualidade de vida afetada, e passando por um inchaço populacional com a chegada de centenas de migrantes e refugiados ao continente.


Não é apenas a África ou o Oriente Médio que precisam de ajuda, a Europa, a Ásia, a América do Norte e do Sul estão lidando – cada um de forma e proporção diferentes – com violações de direitos humanos. Acima da defesa de interesses nacionais, onde se acredita que a fuga mais inteligente é o voltar-se para si, fechando fronteiras e expulsando os “não-cidadãos”, deveria estar a consciência de um universalismo moral, que compreende que uma cooperação transnacional poderia, a longo prazo, reparar os danos que têm sido causados.


Linklater (1998) em seu cosmopolitismo moderno não defende uma homogeneização cultural mundial, mas, um universalismo que reconhece e aceita a diversidade, e que acima de tudo, compreende que o valor da vida humana é imensurável. Uma crise de direitos humanos mundial demanda uma solução mundial, que não passa por intervenções militares ou por bandeiras nacionalistas. Caso contrário, o Mediterrâneo representará o cemitério – não somente de imigrantes – mas da humanidade.


REFERÊNCIAS

ANISTIA INTERNACIONAL. Relatório Anual 2017/18: O estado dos direitos humanos no mundo. London: Amnesty International Ltd Peter Benenson House, 2018.

Corriere Della Sera. Migranti, altro naufragio in Libia: Ci sono 63 dispersi. Disponível em: <https://www.corriere.it/esteri/18_luglio_01/migranti-altro-naufragio-libia-ci-sono-63-dispersi-bf37fda4-7d54-11e8-b995-fbeecea523fe.shtml> Acesso em: 01 de julho de 2018.

G1. Guerra na Síria já deixou mais de meio milhão de mortos, diz ONG. Disponível em: <https://g1.globo.com/mundo/noticia/guerra-na-siria-ja-deixou-mais-de-meio-milhao-de-mortos-diz-ong.ghtml> Acesso em: 01 de julho de 2018.

LINKLATER, Andrew. The Transformation of Political Community Ethical: Foundations of the Post-Westphalian Era. Cambridge: Polity Press, 1998.

UNHCR. Refugee situations. Disponível em: < http://data2.unhcr.org/en/situations/mediterranean#_ga=2.58803437.1109272922.1530493115-1919759762.1530493115> Acesso em: 01 de julho de 2018.

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